Não sem espanto a mãe de santo Stella de Oxóssi recebeu a notícia de sua eleição, na quinta-feira 25, para a cadeira 33 da Academia de Letras da Bahia, lugar ocupado no passado pelo poeta Castro Alves. Ao contrário do hábito dos candidatos nesta e em outras praças, Stella não tinha feito campanha. “Levei um choque, pois é uma coisa que não é comum”, diz a ialorixá do terreiro Ilê Axé Opô Afonjá, primeira mãe de santo acadêmica do País. “Depois vi que foi a comunidade que proporcionou isso e achei uma recompensa.” A posse será em setembro e ela confessa não saber exatamente qual seu papel na Academia.
O título não é meramente honorífico. Mãe Stella publicou seis livros, bem mais do que alguns imortais da Academia Brasileira. Nascida Maria Stella Azevedo dos Santos, formou-se em Enfermagem pela Escola Bahiana de Medicina. Foi enfermeira durante 30 anos até ser escolhida, em 1976, mãe de santo do Ilê Axé Opô Afonjá, uma das casas de candomblé mais importantes e tradicionais do estado, fundada em 1910. O último de seus livros é uma antologia dos artigos publicados quinzenalmente no jornal A Tarde. Escreve à mão e suas “filhas” digitam o texto. “Sou analfabeta em computador.”
Na quinta-feira 2, a ialorixá completou 88 anos. Ela desce as escadas do sobrado onde vive com certo esforço, mas sem o apoio de ninguém. Por causa da dificuldade de locomoção, passa a maior parte do tempo no andar de cima da casa. Só desce para acompanhar a cerimônia de culto a Xangô, orixá da Justiça, às quartas-feiras, ou para receber visitas. Seu cérebro continua, porém, afiado. “Envelhecer é uma briga constante entre o que a mente pode e o corpo não deixa.”
A ialorixá tem o costume de assistir ao noticiário na televisão, ler jornal e revistas. “Gosto de saber das coisas. Se a gente não se informa, vira inocente útil.” Em suas colunas de jornal, conta histórias antigas, fala de espiritualidade, do candomblé e da atualidade. Em um dos textos mais recentes, criticou os sacerdotes que confundem religiosidade com fanatismo e aqueles que utilizam a religião como meio de enriquecimento, inclusive no próprio candomblé. “Alguns acham que o barato da religião é ficar rico baseado na crença alheia”, provoca. “Mas religião não é meio de vida.”
Bem informada, ela acompanha as polêmicas entre líderes evangélicos e homossexuais. O candomblé não é contra os gays e nele não existe a palavra pecado, explica. “Se Deus consentiu que existisse, quem pode ser contra a homossexualidade? Se é um assunto que não prejudica o outro, temos a obrigação de ser felizes.” Ela desmente, com bom humor, a crença frequente entre gays de que o orixá Logun-Edé seria homossexual, por aparecer na tradição como meio homem, meio mulher. “Logun-Edé foi morar com a avó Iemanjá e, como era o único homem no pedaço, passou a se vestir como as mulheres de lá. É mito que seja gay. Mas é um bom mito.”
Na Bahia, os seguidores do candomblé sofrem com o preconceito disseminado por pastores evangélicos, mas esse não é assunto do seu interesse. “Não tenho tempo para perder falando desse tipo de gente, para fazer guerra santa”, diz. “Porém, até Jesus, se fosse deste tempo, iria procurar a defesa dele, não ia sofrer calado.” Se a líder espiritual não fala, outros integrantes do terreiro estão atentos e participam das articulações políticas contra a intolerância religiosa. Mãe Stella lembra de quando Mãe Aninha, a fundadora do Opô Afonjá, foi ao Rio de Janeiro, em 1934, se queixar a Getúlio Vargas da proibição ao candomblé, e conseguiu. O Decreto 1.202 instituiu a liberdade de culto no País.
Tombado como Patrimônio Histórico em 1999, o Ilê Axê Opô Afonjá foi fundado por Mãe Aninha em uma enorme fazenda, que ocupava quase todo o atual bairro. Chamava-se Roça de São Gonçalo. Mãe Aninha, com medo de o terreno ser confiscado pela polícia, prática comum na época, foi ao cartório registrar a propriedade. Quando o funcionário perguntou “Em nome de quem?”, a mãe de santo respondeu: “Xangô”. Como não era possível, Mãe Aninha criou a Sociedade Cruz Santa do Ilê Axé Opô Afonjá, com ata, presidente e tudo o mais, em nome da qual as terras acabaram registradas.
“Ela era uma mulher de visão. Costumava dizer que queria ver todos os filhos a serviço de Xangô com anel no dedo, ou seja, formados”, conta Mãe Stella. Em honra à matriarca, a escola Eugênia Anna dos Santos funciona desde 1986 no terreiro. Atualmente, 350 crianças cursam o ensino fundamental. Além das aulas de matemática, português e demais disciplinas, elas aprendem história e cultura afro-brasileira, com noções da língua iorubá. Com o tempo, o terreno de Mãe Aninha foi invadido e se transformou em bairro. Na parte interna do terreiro, murado para evitar novas invasões, vivem atualmente cerca de cem famílias.
Mãe Stella é a quinta sucessora de Aninha. Depois da fundadora vieram Mãe Bada, Mãe Senhora e Mãe Ondina – a tradição do Opô Afonjá é de vitaliciedade e matriarcado. Stella, cuja mãe morreu quando tinha 7 anos, foi criada por um casal de tios, uma família de bens, “abastada”, como descreve. Seu tio era tabelião e a menina negra estudou em boas escolas da capital baiana. Aos 13 anos, foi iniciada no candomblé a partir da sugestão de uma conhecida. Nas biografias postadas na internet, diz-se que Stella apresentava então um “comportamento não esperado”. Pergunto o que era exatamente. Mediunidade?
“Que nada, era traquinagem. Eu, ao contrário das meninas da minha época, gostava de jogar bola na rua, subir no bonde. Além disso, falava sozinha, tinha meus amiguinhos que ninguém via. Aí alguém comentou: ‘Ela tem de fazer orixá’.” A menina foi levada, primeiro, ao terreiro do Gantois, onde esperou muito tempo e não foi atendida. A tia, brava, acabou por levá-la para “fazer orixá” no Opô Afonjá, com Mãe Senhora. “Mãe Menininha costumava dizer: ‘Você só não fez santo aqui por causa de um recado mal dado’.”
Tanto o Gantois quanto o Opô Afonjá sempre foram frequentados por artistas e políticos. O escritor Jorge Amado, o antropólogo Pierre Verger e o artista plástico Carybé costumavam ir até lá para a cerimônia ou simplesmente para bater papo com Mãe Stella. De Carybé ela recorda o jeito brincalhão. “Era um molequinho.” Ao lado de Verger, a mãe de santo conheceu o Benin, mas se encantou mesmo foi com a Nigéria, terra de seus ancestrais.
“A Nigéria é Salvador, o clima, os costumes, as árvores. Uma vez dormiram uns nigerianos aqui em casa, depois de viajar muitas horas e um deles, ao acordar, olhou pela janela e disse: ‘Andei tanto para saltar no mesmo lugar’”, gargalha. Sobre os políticos, fala que recebeu todos, de Antonio Carlos Magalhães a Jaques Wagner, mas prefere não dizer o nome de seu predileto, para não provocar ciúmes. Filha de Oxóssi, orixá caçador, Mãe Stella diz ter incorporado deste o hábito de não falar muito. “Caçador fica atento, não fala. Quem fala muito se perde. Os antigos diziam que quem fala muito dá bom dia a cavalo.” Ela adora provérbios, tema de um de seus livros. “Sou uma menina tímida.”
Sobre a morte, Mãe Stella conta que, no candomblé, o espírito vira ancestral. “Não vou dizer que não me importo de morrer. Me importo, sim. Não gosto de morrer porque gosto de viver.” E a sabedoria conquistada com o tempo, Mãe Stella, é verdade? “É uma obrigação. Se Deus deu esse privilégio de viver tantos anos, como não aproveitar? Agora, a gente está sempre aprendendo, ninguém é completamente sabido”, ensina. “Aprendo muito com os jovens e com as crianças. Eles têm cada saque tão interessante.”
(Texto publicado originalmente na revista CartaCapital)
Publicado em 16 de maio de 2013
Boa tarde a todos!É emocionante ouvir falar desses ícones do candomblé,mesmo depois de tantos anos e de tanta sabedoria continuam humildes.Pena que algumas pessoas da nossa religião não se espelham nesses exemplos.Que Oxalá de vida longa à ela e a todos que levam o candomblé e a Umbanda a serio.
Regio, belas palavras.
Ire
São estas bibliografias que não me deixam desistir.
Parabéns Bàbá Fernando.
Um lindo retorno.
Epá òrìsà Obà Igbò.
Boa noite!Um comentário:São essas pessoas dedicadas que impulsionam a minha fé,exemplo a ser seguido e me curvo humildemente em respeito.
Fico feliz de ser do CAMDOMBLE MAS FICO MAIS FELIZ PORQUE UM DIA CONHECI MÃE ESTELA PODER TOMAR SUA BENÇÃO E SE SENTIR SUA FILHA ……OBRIGADA MÃE PELA SUA hUMILDADE E SABEDORIA …..sure fun mi……
Eu particularmente tenho muito admiração de pessoas como ela apesar de eu não ha conhecer mas só de saber da história de vida dela pra mim é uma honra de saber o que eu na realidade o que tenho de fazer é bater cabeça pra uma ialorixá e pedi sua bença muita bença mesmo e ter a esperança de ser abençoado por ela axé pra todas e todos meus irmãos
Boa tarde a todos e todas!
Certa vez Mãe Stella esteve em um Candomblé próximo da cidade onde moro, ela esteve em João Pessoa-PB., e a vi à distância. É uma referência e sua ocupação na Academia é justa e é um reconhecimento muito grande pelo que ela é. Mulher, negra e do Candombé, entre outras qualidades. Na realidade todos nós estamos de parabéns, nós estamos lá, com ela, assim eu entendo. Ela é uma representação do coletivo do Candomblé, dos que possuem compromisso e respeito pela religião.
Um abraço a Mãe Stella e todos(as).
mãe stella é uma pessoa maravilhosa !trata bem todos!agora agora alguns que estão ao seu redor pode distorcer sua imagem!!pois tratam as pessoas com arrogância!isso acaba deixando uma má imagem!!!
Boa noite a todos!Srº da Ilha e moderadores do blog estou pedindo licença para dizer que hoje li no site da Casa de Oxumarê um post sobre a iniciação de Pai Bobô de Oyá,muito interessante,se puderem dar uma lida.Axé a todos.
Mãe Stella vai ocupar a cadeira 33, cujo patrono é o poeta Castro Alves. Lançou 6 livros, bem mais do que alguns destacados integrantes da Academia Brasileira. Aos 88 anos reflete: “Não gosto de morrer poque gosto de viver”.
Axé!
Boa noite. E uma honra saber q ainda existe alguem como a senhora dentro da nossa religiâo. Pois hoje existem tantos estorquiadores q fazem do orixa uma fonte de dinheiro. Na verdade eles são fonte de energia espiritual que nos fortalece todos os dias. Que Oxala continue te abençoando todos os dias de sua vida e que Oxossi esteja sempre te trazendo muita fartura. A sua bença.
a sua bença mae pesso qeu a senhora pede para os orixas qeu abençoa a mim e minha familha e mim dar força para vencer toda as bareiras do meu caminho.
Date: Thu, 8 May 2014 11:36:29 +0000 To: aparecidarosasilva@outlook.com
Realmente ela merece!agora para o povo do candomblé seria necessário mais um pouco de humildade , como eu tinha falado com ela sobre minha situação espiritual, por ser um abiku e necessitar de ajuda de pessoas que possam demonstrar mais confiança, e não pode mim ajudar, alegando que não poderia mim ajudar e iria pedir a xangô que mostrasse uma pessoa para mim fazer minha obrigação!!Infelizmente muitos candomblés se movem pelos valores de quem tem mais!!!é o tratar, é a forma de abordagem!A natureza é una !!somos todos irmãos derivados de uma mesma energia(olonan ou lonan), a questão que se fosse uma pessoa que tivesse uma boa condição social será que essa pessoa seria ajudada?todas as divindades por mais energias diferentes que sejam , são providas de uma energia maior e una, devemos dar as mãos e extende para o outro de forma limpa e com compaixão, se candomblé é humildade e força, acredito irmãos que a força está quando ajudamos o outro incondicionalmente, o candomblé nos mostra a sutileza da vida, que é amar o teu próximo sem indiferença, é senti que o bem é maior que tudo, que nos faz nobre e adquirimos força perante a natureza humana, uma conhecida minha ekedi veio mim falar que o pai dela tem muito axé, por isso que ela está lá!eu disse que axé pra mim é ter saúde, abrir minha geladeira e meu armário e não faltar nada, ter sabedoria e equilíbrio para enfrentar os embates da vida.Espero que alguns possam mim entender, pois estou sendo sincero, pois ter anos de santos não basta, temos que ter uma visão mais além do que um status que se conquista perante as pessoas, temos que fazer valer apena a força vital que nos impulsiona a se sobressair de todos esses embates.Motumbá!!!
Motuba! Bom dia!
Aprecio muito o trabalho de todos vcs e a responsabilidade em abrir este espaço. Sou Ya efun e necessito muito de alguns livros ou matérias a respeito dos efuns e pembas. Sempre acho livros sobre as folhas, Orixas, alguns rituais, porém sobre os efuns não consego achar nada. Aguardo breve contato.
Obrigada. Ase. Luciana
Date: Thu, 8 May 2014 11:36:50 +0000 To: lupasamuel@hotmail.com
Luciana Ìyà fufun é um lindo cargo.
A funções dos pós (não usamos pemba) podem ser estudadas e devem ser estudadas junto ao seu sacerdote, á áwo sua utilização.
Tenho uma pequena informação em meu blog pessoal:
http://www.orisaifa.blogspot.com – procure por ebo.
ire
Gostaria de saber se posso falar com essa mãe de santo
Rita você deve buscar o endereço na internet.
Não é difícil de conseguir o contato.
Ire