Foto telescópio Hubble.
Os Òrìsá são considerados nossos genitores, uma vez que associados a elementos cósmicos ou à natureza. Dessas energias que interagem e se entrelaçam, emanam as formas materiais que abrigam a nossa existência individualizada na Terra. O Poder Feminino é desde que o ser humano tomou consciência de si, associado à capacidade de criar e destruir a Vida, reverenciado como controlador das grandes energias sobrenaturais. Suas imagens, sob diversas formas, são as primeiras manifestações artísticas nos sítios arqueológicos desde o Paleolítico, sempre representando a fertilidade e primeiro contato do ser humano com o Divino. A Terra precisa ser aguada constantemente, recebendo o “sangue branco”- a chuva – para propiciar nossa alimentação e sobrevivência. Então a Mãe Terra na cultura africana conhecida por vários nomes, sendo o mais popular atualmente, Onilé, passa a ser reconhecida como organismo vivo e cultuada como Divindade. Ela é agba n’la, a grande cabaça doadora da Vida que precisa ser sempre ressarcida, pois o equilíbrio é mantido através de um constante sistema de compensação. Alimenta-se dos corpos mortos para que lhe seja restituída a capacidade geradora. Restituição e renascimento é a espinha dorsal dos ensinamentos de Ifá, que por sua vez sustentam a concepção yorubá das relações entre o òrun (o universo espiritual) e o ayè (a manifestação material). Então, iku (a morte) restitui a Terra o que lhe pertence, permitindo, assim, os renascimentos e sob esse aspecto, seria simbolicamente importante como instrumento de restituição do asé (energia vital.) Toda restituição demanda destruição da matéria individualizada que, uma vez reabsorvida, vai nutrir a massa geradora, restauradora de asé num ciclo contínuo que perdurará enquanto o planeta existir. Sendo a Terra aquela que, desde os primórdios, tudo vem testemunhando e até hoje nada acontece fora da sua presença, costuma-se realizar pactos em seu nome e a esse testemunho recorremos quando nos sentimos injustiçados. Talvez esteja nessa necessidade imperiosa de ser constantemente ressarcida e aguada para poder procriar com abundância, a razão da ambigüidade do Poder Feminino, tão freqüentemente expressada em mitos e rituais de vida e morte. Daí a importancia da ancestralidade, que é a corrente que garantiu a continuidade da nossa existência na Terra. Os renascimentos dependem dos ancestrais e sua matéria de origem é a lama. Logo após o neolítico, ou seja, no início da Idade dos Metais, na transição quando o nômade caçador se estabelece como agricultor e funda os primeiros agrupamentos humanos, a Divindade Feminina responde por todos os processos da nossa existência neste planeta. Com o estabelecimento e a posse da terra, a sociedade torna-se patriarcal /patrilinear e clãs familiares são fundados e chefiados por linhagens masculinas e as mulheres vão perdendo o seu poder. Segundo os mitos, Ogun – a tecnologia – teria arrebatado a liderança, numa disputa com todas as iyagbás (Divindades femininas), com o auxílio de Elegbara, Òrúnmìlá e Sàngo. Antepassados divinizados assumiram papel de divindades primordiais e houve uma redistribuição de tarefas entre os inúmeros Òrìsá. Aí começa a fase patriarcal na história da humanidade. A sacralidade da Terra e tudo o que nela vive, é o ponto de partida da concepção yorubá do mundo. Mesmo consciente da existência de um Poder Universal Absoluto (Olodumarè) que rege todas as galáxias no céu e as próprias Divindades na Terra (Òrìsá), essas energias da natureza que nos tocam e influenciam o nosso cotidiano é que são cultuadas. É a elas que se recorre nos momentos de aflição e se reverencia nas ocasiões de júbilo. As Divindades femininas do panteão yorubá, as iyagbás (Aiyagba/Aiyá-òba rainha) possuem os mesmos atributos das Deusas nas demais civilizações arcaicas, pois as diferenças são apenas culturais, uma vez que os arquétipos pertencendo ao inconsciente coletivo da espécie humana – são os mesmos. Nàná é a mãe ancestral, importada das terras do Daomé. É a mulher sábia, a anciã que atingindo a menopausa, já não verte sangue. Por isso retém em si o poder da procriação. Como associada à lama e às águas contidas na terra, liga-se ao processo de fertilidade da terra. Simboliza a maternidade arcaica indiferençada, pois é a mãe de todos os seres, a partir dos moluscos dos pântanos. São seus filhos os mortos e os ancestrais. Já Yemojá surge como Mãe do homo sapiens. Como “Mãe dos filhos-peixe”, simboliza a vida que veio do mar e também daqueles que saíram do líquido amniótico. É uma divindade do rio que emigra para o mar (domínio de Olokun, que fica então relegado às regiões abissais. O fascínio de Yemojá – sob diversos nomes – abrange todas as civilizações do planeta e enriquece o folclore ligado aos seres encantados do mar. Como maternidade educadora, rege a consciência e, portanto, é reverenciada como mãe de todos os seres pensantes Mãe do homo sapiens. Oyá é uma Divindade do rio. Seu nome significa “aquela que rasga” no caso, o rio Niger. É o arquétipo da guerreira, plena de atributos, todos conquistados por esforço próprio, assim como da transformação. Por isso, embora Yemojá seja a “dona” das mentes, é à Oyá que recorremos nos processos de autoconhecimento e superação de crises. Oyá é a própria eletricidade dos raios que transmutam as energias na atmosfera do planeta. Como Senhora dos ventos, distribui as sementes expandindo a Vida e por outro lado, dissemina as doenças. Como transita entre as nove dimensões da Terra, preside e está presente também no portal da morte. Associada ao irrefreável poder animal representado pelo búfalo, carrega chifres, como todas as Divindades lunares nas diversas civilizações. Oyá é a contraparte feminina do Òrìsá Sango. De Òsun provem as águas, pois ela é o próprio útero da Terra. Senhora da fertilidade, dela depende a Vida no planeta. É interessante considerar que todas as águas, mesmo as dos mares e das chuvas, provem dela – e que toda a água existente na Terra, sempre foi à mesma. Ela vem das profundezas, dos mananciais que guardam os tesouros – por isso é a dona do ouro e das pedras preciosas – e o segredo da Vida. Òsun é a mãe de todos os seres porque preside o processo da gestação, que assegura a continuidade da Vida. Assim, é também a Deusa do amor e da beleza. É a grande força oculta que opera em silêncio, para irromper na violência das cachoeiras que tudo arrasta e dissolve. Ocultando o segredo da geração – que é o “milagre” supremo (que até hoje a ciência reproduz, mas não cria), Òsun torna-se também a Senhora da Magia. Esse poder gerador associa todas as Deusas e, por extensão, todas as mulheres, pois ela detém autoridade decisiva de vida e morte já que delas depende a sobrevivência das crianças e são, no plano humano, as representantes naturais da Magia Ancestral. Esta Magia é associada aos pássaros (símbolo da projeção astral), que em todas as culturas surgem como seres alados, imagens fundamentais da energia feminina superior no Universo. A representação máxima deste poder são as Iyà mi Agbá, Senhoras da noite, e também das fogueiras, arquétipos da coletividade ancestral feminina desde a criação do planeta. É um poder que, mesmo atribuído às mulheres velhas, pode, em certos casos, pertencer igualmente a jovens que o recebam por herança ou o adquiram por direito de linhagem espiritual, através de rituais. O poder do Sagrado Feminino é supremo no ayè (plano material), mas para que o equilíbrio seja mantido, está submetido ao triunvirato supremo logo abaixo de Olodumarè (Deus / Absoluto Arquiteto do Universo): Obatalá (Logos solar), Òrúnmìlá (Senhor da sabedoria e do oráculo) e Elegbara (o Òrìsá Esù – transformador da energia em matéria). Este é apenas um resumo introdutório. Um aprofundamento requer o estudo dos itan (mitos) do corpo literário de Ifá, pois o assunto é riquíssimo e bastante complexo.
Por: Eliane Haas, Iyà Ègbé Efunlase.
cadê Ewa nesse texto???
Isabela estamos falando de uma metafora da criação do mundo e a manutenção do àse, a força vital que sustenta todo o Cosmos.
Iyewá não está ligada a natureza da transformação, da fecundidade da terra, leia Ifá e interprete seus poemas sagrados onde não há registro deste òrìsá na cosmogonia ioruba.
Não desprezamos sua energia dentro do equilibrio da terra e de seus misterios, porém, estamos falando de cosmogenese, Estamos falando de uma visão Ogboni do culto da mãe terra (Onilé), da doação do barro de Nàná, materia primordial na confecção dos corpos (ara) por Obatalá. Estamos falando de Ikù e sua missão que é restituir esta materia ao seu leito natural, o próprio chão.
Não se sinta doída por Iyewá não parecer no texto, mas na cosmogeneses e cosmogonia ioruba, este òrìsá não é sitado.
Mas a porta está aberta e vc pode aprofundar seus estudos e nos trazer informações novas.
Ire o.
Estou parabenizando pela beleza e clareza de como explanou o assunto de modo de que qualquer pessoa ainda leiga em nossa religião entenda sem duvidas os motivos de nossa devoção a tudo quanto se desdobra na Cultura da Civilização Yoruba e etc…
Isabela,
Existem outros entendimentos e conceitos Yorubanos sobre a presença de Mãe Ewá. Ela representa o movimento de rotação e translação de todos os planetas, está ligada à estrutura do cosmo e influencia na natureza terrestre.
Em sua dança, suas mãos, representa significativamente estes movimentos.
A principal Igbámolè Ebora Dudu é a grande Divindade do Preto, a Igbá-molè/Iyangbá Odùduwa, a Grande mãe de tudo e de todo poder feminino, delega a Ewá juntamanente com Orisan’lá o poder do equilíbrio do firmamento através dos movimentos de rotação e translação da terra e as fases da lua.
Nesse entendimento, o triunvirato é visto de outra forma: sendo Olodunmare – O Grande criador e ser incriado. Orixan’Lá o grande parceiro gerador também conhecido por Obatalá e nas corruptelas de Orixá/Oxalá. A Igbámolè Iyangbá Oduduwa, parceira gestante, do casal divino, muito bem representanda através da cabaça de Odù (Igbá Odù) que representa tanto o universo criador quanto o universo criado, ambos criados simultâneamente por Olodunmare.
Como disse o Da Ilha, a porta está aberta…
Òrúnmilà gbè ó!
Parabéns pelo post.. anteriormente já havia pedido para falar mais sobre os Ogboni..
Segundo algumas pesquisas trata-s de uma sociedade secreta, existem aqui no Brasil ou só na África?
Ifá preenche muito bem a importancia do equilibrio entre o masculino e o feminino, e principalmente a voltarmos para nossas raizes ( nossos ancestrais).
Muito obrigada mais uma vez pelas informações.
Muito bom. esse texto me fez entender melhor o poder feminino dentro da nossa religião
Claudia existe culto Ogboni no Brasil sim.
Seus fundamentos e reuniões são particularizadas, somente os inicados podem participar.
Mas não é secreta, quem é Ogboni diz que é.
Ire o.
Claudia vc pode ver minha pagina pessoal e ler um pouco mais sobre Ogboni.
http://www.orisaifa.blogspot.com
Ire o.
Boa tarde!
Estou no meu trabalho e resolvi abrir este link q tenho em meus favoritos..por conta de uma situação difícil que minha irmã vivi neste momento. estava conversando com ela…falando de seu orixá (Oxum)da força interior que temos..minha irmã é linda..tem as caracteristicas dos filhos de oxum..e Oxum dela é belíssima..já faz um tempo que ela ñ “recebe”ela sente a energia Dela..quando li seu texto..e me deparei com esta frase “É a grande força oculta que opera em silêncio”estou muito emocionada.
o coração apertado já ñ sei mais por onde ajudar..ela está sem FÉ.Senti vontade de chorar..Fica Com DEUS.
Cintia o Orí é soberano, se ela fechou a porta, somente ela poerá abrir.
Se ela esta desmotivada deve haver algum motivo, o que se pode fazer e conversar e tentar ajudar.
Mas a decisão final será sempre dela.
Ire o.
Odupè..
Gostei muito.
Se me permitirem..
Segue link que explica de maneira mais simplificada.. me ajudou muito.
Click to access Ogboni.pdf
Cláudia,
Há uma grande controvérsia sobre Oduduwa, visto pela Eliane como guerreiro mítico que veio do Egito e fundou Ilê Ifé e altercava com os Lufons.
Num outro conceito Yorubano da criação da terra por Olodunmaré, a principal Igbámolè Ebora Dudu é a grande Divindade do Preto, a Igbá-molè/Iyangbá Odùduwa, a Grande mãe de tudo e de todo poder feminino. Entendemos o triunvirato de outra forma: Olodunmare – Obatalá & Igbámolè Iyangbá Oduduwá
Alguns Ogbonis tem uma visão patriarcal e até machista para seus conceitos, relegam o tal poder feminino à um segundo plano,inclusive algumas divindades, escrevendo orikís, itans, para defender posições e conceitos pré-estabelecidos, afinal, o sistema Ifá dita regras? essa é sua função dentro da sociedade?
Ignorar a presença genitora feminina como parceira na criação do mundo é no mínimo curioso, fica a impressão que eles não foram gerados por mulheres, até porque Olodunmare não tem sexo, ele é o incriado, Ala Abá L’Axé. Deus é menina e menino, sou masculino e feminino, já dizia a música de Pepeu Gomes.
Olodunmare cria “simultaneamente” Obatalá e Oduduwá – O terceiro a ser criado foi o Imolê Exú Agbá, o Ancestral, da associação água + terra= Eerúpé (lama) + o hálito de Olodunmare que o vivifica, sendo primeiro Ara Orún/corpo do além.
A Igbá Odù (cabaça dos odús) representa a junção do Casal divino, Obatalá & Oduduwá, onde a parte superior representa a Divindade masculina e a parte inferior a parte feminina, abrigando no seu interior os elementos materiais capazes de representar e emanar as qualidade das três classes do Poder da Criação: O Iwã/Branco/Existência, o Axé/vermelho/Realização e o Abá/Preto/Essência, representando assim, tudo que existe.
A partir daí huve a criação de todos os Awon Imolê/muitas divindades, os descendentes Omodè Okùrin e os Omodè Obìrin, e quem chamamos carinhosamente de Orixás.
axé.
Mo jùbá egbon, ago l’onan.
Colaborando com uma parte que ficou um pouco escondida. Seria muito interessante todos saberem que existe uma diferença entre o Herói mitico das terras iorubas, Oduduwa ou Ninrod, o guerreiro que atravessou terras vindo do leste, há controversias entre sua origem, Meca ou Egito, sendo o Egito o mais provavel, pois escavações arqueologicas encontraram artefados que comprovam ser o Egito sua origem de partida.
Este Ser, patrono espiritual do povo ioruba, tem seu nome como homônimo do Òrìsá Oduá ou Oduwá ou Oduduwá, tão bem descrito pelo senhor.
E a terra chamada Ilè Ifé (terra que se espande) citada na cosmogonia e a citada pelos historiadores com a atual Ilè Ifé, geograficamente não são as mesmas.
Oduwá tem seu papel de relevancia dentro da cosmogonia ioruba, quando ela mesma espalha sobre as águas o saco da existencia contendo a terra ‘encantada’ por Olodumarè, visto que Obatalá estava preso dentro do oogun de Esù e recebe o poder de reinar sobre e debaixo da crosta terrestre junto com Onilè ( ou seria a mesma energia?).
Portanto Oduá ou Oduduwá, não são os mesmos personagens historicos.
Uma vez que estamos falando de cosmogonia quando nos referimos a Oduduwá.
E outra coisa quando nos referimos a organização da atual Ilè Ifé, pois povoada esta terra já estava quando Ninrod (Oduduwá), o guerreiro, chega e reune o povo presente e funda o imperio atual e milenar e o expande através de guerras e novas conquistas.
Acho que a confusão na cabeça das pessoas se forma através destes nomes identicos, mas com personagens e histórias completamente diferentes.
Desculpe pela intromissão Bàbá.
Ire aiku egbon.
Mò Jùbá Asé, Agò yà
Extamente, homônimos. Odudua é visto erradamente como herói fundador de Ilê ifé, na verdade foi um invasor vindo do Egito, expulso por sua família por conspirar contra o governo e querer tomar o poder. Invadiu as terras dos Yurubás, saqueou e destruiu várias cidades até se interpor com os Lufons no reino que cultuava Obatalá, é destruído por sua ambição e morre cego e doente e sem apoio de Oranian já fortalecido por ter um fundado Oyó um reino próspero e muito mais forte que Ilê Ifé.
Àìkù olófà àyànfé.
Ago, mais velhos.
Pronto. Uma confusão de conceitos desfeita a partir de ótimas explanações.
Mo dúpé!
Dayane,
Uma outra confusão que se faz é quanto o “Eledá” , o “Criador”, que é confundido com o Orixá da pessoa. Eledá é o próprio Olodumare, o Grande criador.
Outro conceito complicado e contraditório é o sistema de retorno , a reencarnação que os Ogbonis acreditam, a tal lei do retorno.
O conceito Orixalista entende que não há reencarnação, não existe esta possibilidade, a vida finda fazendo parte da natureza como todos os seres vivos.
Adupé ò.
Obrigada pelo excelente artigo. Lindo auxílio para meus estudos.